O Sumiço da Santa revela um Jorge Amado mais contemporâneo
O público baiano vai conhecer uma
face mais contemporânea de Jorge Amado, revelando uma Salvador urbana e que se
abre para transformações das tradições e hábitos. Essa é a marca deO Sumiço da
Santa, romance de Jorge Amado, que tem sua primeira versão para teatro,
assinada pelo dramaturgo Claudio Simões e com direção de Fernando Guerreiro. A
montagem estreia nesta sábado, dia 15 de setembro, às 20h, e fica em cartaz de
sexta a domingo, às 20h, com ingressos a preços populares, R$30 e R$15
[meia-entrada], no Teatro ACBEU (Corredor da Vitória), que reabre
especialmente para a temporada do espetáculo.
A peça homenageia o centenário do
autor grapiúna, encarnando no teatro os personagens da obra das mais recentes
do escritor. A produção é da Janela do Mundo e da Multi Planejamento Cultural,
com patrocínio da Chesf, através do FazCultura, e da Embasa, por meio da Lei
Rouanet, e apoio cultural do Banco do Nordeste e Rede Bahia.
Publicado em 1988, Jorge Amado revela
em O Sumiço da Santa uma Salvador da década de 70,
em pleno desenvolvimento urbano, expansão da Universidade Federal da Bahia e
conflitos ideológicos entre a tradição e a modernidade, mas também as tensões
de uma cidade multifacetada racial e religiosamente. A trama mostra os
transtornos pelos quais passa a cidade depois do sumiço de uma imagem
de Santa Bárbara, vinda de Santo Amaro para uma exposição de arte sacra. A
história se passa durante a ditadura militar e reúne religiosidade e política
num só texto, permeado por um realismo fantástico e bastante humor, com aquele
toque de crônica do cotidiano soteropolitano de Jorge.
Bahia Moderna - “As
lembranças das obras de Jorge Amado são de uma Bahia rural, com cidades
pequenas e uma vida quase que em aldeia. Em O Sumiço da Santa temos
uma cidade grande invadindo a pequena”, explica Fernando Guerreiro, que imprime
suas marcas de agilidade e humor ao espetáculo. “O que queremos com a montagem
é contar um grande ‘causo’, traço característico de Jorge Amado. Mas também
tratar do respeito à diversidade de culto”, acrescenta o diretor.
Para Guerreiro, o espetáculo é uma
grande defesa das religiões de matriz africana, traço indissociável da
trajetória de Jorge Amado e de obra. “Na história, Iansã vem para Salvador para
convencer uma mulher que nega sua negritude e suas raízes”, revela o encenador.
A Santa Bárbara em questão na história existe de fato, tem traços barrocos,
participa dos festejos religiosos de Santo Amaro e está sendo copiada
especialmente para a montagem.
Personagens reais e fictícios
convivem na trama que foi costurada pelo dramaturgo Claudio Simões. Em cena,
transitam nomes como Dona Canô, a atriz Nilda Spencer e os diretores Jesus
Chediac e Hebe Alves, presentes no universo da efervescente Escola de Teatro,
nos anos 1970, local que uma das protagonistas da história frequenta. “A Escola
de Teatro é citada no texto original para trazer essa Bahia urbana, em
crescimento. Isso convive com citações de nomes como Caetano, Bethânia, que
tinham uma expressividade forte nessa época. No texto, também buscamos
características de pessoas públicas como Mãe Menininha e a própria Zélia Gattai
para compor a personagem Mãe Zélia, que é uma ialorixá soberana”, pontua o
dramaturgo.
Simões mantem as características de
sua dramaturgia em O Sumiço da Santa, como a agilidade
nos diálogos, a ironia e o toque do humor. Nessa montagem, renova a parceria de
sucesso com Fernando Guerreiro, que rendeu espetáculos como Abismo de
Rosas, Volpone, O Indignado e Vixe Maria, Deus e o Diabo na
Bahia. A peça contou também com a contribuição de Gil Vicente Tavares na
primeira fase da adaptação da obra.
A cenografia de Zuarte Júnior parte
do princípio de não explorar o universo já reconhecível de Jorge Amado,
tampouco de uma Bahia folclorizada. Com referências expressionistas e da
própria representação dos elementos que compõem o mito de Iansã/Santa Bárbara,
o cenógrafo criou um espaço pré-tempestade. “No palco, haverá uma enorme pedra
cinza, materializando uma nuvem densa, sólida, que anuncia algo que pesa sobre
a cabeça dos personagens e sobre a cidade”, explica o artista.
Uma novidade de O Sumiço da
Santa é a participação do músico Leitieres Leite, pela primeira vez
assumindo a função de direção musical para teatro, compondo uma canção
específica para a obra. Na trilha sonora, músicas dos anos 1970 remetem à época
em que se passa a história e cantos religiosos – do catolicismo e do candomblé
– celebram Santa Bárbara e Iansã. As canções contam um pouco da história e,
principalmente, compõem o clima das cenas. Essa atmosfera também está evidente
nos figurinos concebidos por Miguel Carvalho, explorando o rico universo visual
dos anos 1970 e as múltiplas referências da época.
O elenco foi escolhido de acordo com
o perfil dos personagens e, claro, visando a qualidade técnica. Andrea Elia [As
Velhas; Boca de Ouro] interpreta Adalgisa, a tia da Manela de
Ana Cecília Costa [da novela Cordel Encantado; Capitães da
Areia], que volta aos palcos baianos depois de 20 anos. Ângelo Flavio [Quincas
Berro d’Água; À Beira do Caminho] é o padre Abelardo, um
comunista envolvido na luta pela terra; o organizador da exposição de arte
sacra é Dom Maximiliano, vivido por Marcelo Praddo [Boca de Ouro; Os
Javalis]. Agnaldo Lopes [À Beira do Caminho; Cega Seca]
representa o delegado Calixto, enquanto Marinho Gonçalves [Alugo Minha
Língua; Capitães da Areia] interpreta o malandro Danilo. Também
estão no elenco Victor Kizza, Denise Correia, Mariana Borges e Deilton José.
Completam a escalação Dado Ferreira, Mariana Passos e Laís Lopes.
SERVIÇO
O quê: “O Sumiço da Santa”
Quando: a partir de 15 de setembro,
de sexta a domingo, 20h
Onde: Teatro Acbeu [Av. Sete de
Setembro, 1883, Corredor da Vitória. Tel.: 71 3444-4411]
Quanto: R$30 e R$15 [meia-entrada]
Crédito das Fotografias: Maira Lins
Contatos: Janela do Mundo – (71)3267-1355 Karlene
Rios (9949-8517) ou Mônica Santana (9974-5289)